Só uma oração persistente, contínua (comunitária, em família, em grupo, individual) nos pode permitir entrar no coração de Deus e com Ele estabelecer uma relação de amor pessoal.
O que está em causa? A felicidade, aquilo pelo que todos nós ansiamos e que só se encontra nesta vivência de intimidade com o Pai. Por isso, Jesus nos contava aquela parábola do Juiz iníquo e da pobre viúva que constantemente lhe suplicava que fosse feita justiça. Com ela, Jesus pretendeu falar-nos na importância de rezar sempre, porque Deus não é um Juiz e muito menos iníquo, mas antes que é um Pai e que sempre acabará por nos ouvir e fazer justiça, se, evidentemente as nossas súplicas forem justas e se encaminhem nessa direcção de justiça.
O tema da oração continua. Já sabemos como é importante rezar sempre e sermos justos nos nossos pedidos. Hoje reflectimos sobre a atitude interior que devemos possuir quando nos entregamos à oração. E não apenas na oração, mas na vida.
A parábola do fariseu e do publicano está ambientada no templo de Jerusalém, lugar típico de oração e sugere já a problemática de Jesus contra o templo. Quanto a protagonistas, os fariseus eram considerados (por eles mesmos e pelo povo) como crentes fiéis e cumpridores; já os publicanos, por razões do seu ofício, eram tidos como pecadores e afastados de Deus.
Diante da oração são-nos apresentadas duas atitudes, que são, no fundo, duas formas de estar diante de Deus, radicalmente contrapostas. A do fariseu não é uma oração verdadeira e não apresenta nenhuma necessidade de Deus nem nenhuma confiança nele, pois apenas consiste numa apresentação dos próprios méritos e virtudes. É certo que não mente, mas a sua atitude é orgulhosa, petulante e prepotente. Tece uma oração de acção de graças, mas a atitude e o espírito não o é. Contrariamente, o publicano, reconhece a sua autêntica realidade pecadora e espera tudo de Deus. Não fala muito, mas reza profundamente desde o seu espírito numa atitude de súplica, reconhecendo a sua pequenez.
Há que rezar sempre. Mas com um coração humilde e sincero, a partir da autenticidade da nossa debilidade e pecado. Nada mais impeditivo para receber Deus que julgar-se justo, seguro, auto-suficiente e desprezar os outros.
Na oração como na vida, há fachadas belas que escondem autênticas ruínas. Roupagens elegantes que encobrem corações egoístas. Há sorrisos hipócritas que dissimulam más intenções. Para muitos, o que conta é a fachada, o externo, a aparência. Lamentavelmente vivemos cada vez mais num mundo de fachadas, aparências e hipocrisias. E, na própria vida de Igreja, não estamos impunes do contágio desta hipocrisia, imagem e auto-suficiência. Hoje parece que não precisamos de ninguém: até mesmo de Deus e da sua Salvação, não apenas na sociedade humana, mas inclusivamente na própria Igreja.
Há muitos cristãos que o são pelo Baptismo e outros que até praticam a sua fé, que não precisam de Deus e da Salvação. Estranho? Contraditório? Por um lado sim, obviamente, porque o cristão é o seguidor de Jesus Cristo. Por outro não, porque muitos dos cristãos são-no sem saber muito bem aquilo que são, vivem a prática religiosa mas não a relação com Deus em seu Filho Jesus Cristo.
Quantos estamos conscientes neste momento que Deus está aqui connosco? Quantos viemos para dialogar com Deus? Quantos conseguimos ver Jesus Cristo na Palavra Proclamada e na Hóstia Consagrada? Todos os que aqui estamos, viemos porque necessitamos de Deus, do seu Amor, da Sua Salvação, da Vida Eterna?
Quantos não são os gestos, palavras e atitudes que aqui temos sem sentir! Quantas coisas fazemos mecanicamente sem sentido de serviço a Deus e à Comunidade! Quantas missões desempenhadas e palavras bonitas que nos enchem de orgulho! Quantos olhares superiores em relação aos irmãos presentes e até em relação a Deus ao não acreditarmos nem assimilarmos algumas coisas que escutamos e vemos! A condição necessária para nos deixarmos converter e libertar por Deus é que reconheçamos que O necessitamos. É ter necessidade da salvação. Entrar na órbita da acção misericordiosa de Deus a partir da nossa condição humilde de pecadores e necessitados. Deus não fica pelas aparências: Ele gosta de olhar o coração. Peçamos, nesta Eucaristia, com a força do nosso coração sincero e humilde: Senhor tem compaixão deste pobre pecador!
(...)
Caros irmãos e irmãs, celebremos a Eucaristia, e, neste dia das Missões, peçamos ao Pai que nos ajude a ser verdadeiros missionários, evangelizadores, no nosso meio. Rezemos por toda a Igreja, para que leve o conhecimento de Deus e a Salvação a todos os homens. Rezemos muito especialmente por aqueles que têm muitas dificuldades para falar do Evangelho e que, por este motivo, são perseguidos de muitas maneiras.
Pe. Henrique Manuel Rodrigues dos Santos (Capelão da UBI, notas tiradas da homilia de 24 de Outubro de 2010)