"TERNURA E BONDADE NÃO SÃO SINAIS DE FRAQUEZA E DESESPERO, MAS SIM MANIFESTAÇÕES DE FORÇA E RESOLUÇÃO".

sábado, 1 de junho de 2013

O caminho faz-se caminhando

Todo pasa y todo queda,
pero lo nuestro es pasar,
pasar haciendo caminos,
caminos sobre el mar.

Nunca persequí la gloria,
ni dejar en la memoria
de los hombres mi canción;
yo amo los mundos sutiles,
ingrávidos y gentiles,
como pompas de jabón.

Me gusta verlos pintarse
de sol y grana, volar
bajo el cielo azul, temblar
súbitamente y quebrarse…

Nunca perseguí la gloria.


Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.

Al andar se hace camino
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.


Caminante no hay camino
sino estelas en la mar…

Hace algún tiempo en ese lugar
donde hoy los bosques se visten de espinos
se oyó la voz de un poeta gritar
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar…”

Golpe a golpe, verso a verso…

Murió el poeta lejos del hogar.
Le cubre el polvo de un país vecino.
Al alejarse le vieron llorar.
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar…”

Golpe a golpe, verso a verso…

Cuando el jilguero no puede cantar.
Cuando el poeta es un peregrino,
cuando de nada nos sirve rezar.
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar…”

Golpe a golpe, verso a verso.

Antonio Machado

domingo, 5 de maio de 2013

Ser Mãe


Houve alguém que me pediu que escrevesse um texto sobre a Mãe...(...) Apesar de me sentir extremamente honrada, tentei recusar dizendo que era uma grande responsabilidade e que não me sentia à altura do pedido que me estava a ser formulado!

Tentei mais uma vez resistir…mas, como não tive sucesso nas desculpas, escrevi então algumas linhas que dão testemunho desta imensa graça que é ser Mãe!

No silêncio do meu coração pedi a Deus que me ajudasse a formular em palavras como sinto, vivo e partilho a maternidade.


A ideia que desde logo me surgiu foi que o Dia do Bom Pastor e o Dia da Mãe, que hoje vivemos, representam duas imagens de ternura sagrada onde as semelhanças são maiores do que as diferenças.

O Bom Pastor dá a vida pelas suas ovelhas, segue à sua frente e conhece cada uma delas pelo nome, preocupa-se com elas de maneira única e pessoal porque as ama.

O Bom Pastor é o sacerdote que está sempre presente, que é conciliador, que tem sempre uma palavra amiga, que nunca se esquece da sua comunidade e que, mesmo longe, está sempre perto!

O Bom Pastor é Jesus Cristo crucificado, morto e Ressuscitado que se doou a si mesmo até à Cruz. É um Deus, que é Pai e Mãe, presente e próximo que ama, cada um de nós, de forma singular e gratuita. É um Deus que educa, compromete, consola, exige, une e congrega.

Tal como o Bom Pastor, a Mãe também dá testemunho de uma vida de doação e sacrifício.

A mãe, com um sorriso nos lábios e o coração repleto de amor, acolhe, no calor do seu seio, a vida que gerou e a sua grande missão é cuidar, proteger, educar e guiar o filho. A mãe amamenta, embala, partilha com o filho a sua própria vida e protege-o dos perigos escondidos.

O coração materno está repleto de amor. E este, é um amor sem limites e gratuito que nasce no momento da concepção, fortalece, na dor, quando dá à luz e permanece até à eternidade. A mãe, escondendo as lágrimas de dor, consola o seu filho, aguardando, serenamente que a angústia dê lugar ao júbilo, com toda a persistência e zelo numa relação plena de intimidade, afecto e ternura.

A mãe não procura a sua glória nem tem qualquer prestígio a defender, mas tudo recebe do seu filho com simplicidade e alegria. A mãe é exigente, prega sermões, transmite valores, cuida, aconselha, une e reúne, é bondosa e sensível.
A mãe é a catequista que, com a graça do Espírito, ensina o verdadeiro amor e orienta o seu filho num caminho de autêntica fé dando-lhe a conhecer o Evangelho. É a amiga que caminha a seu lado e o ajuda a crescer, com coerência e segurança, está sempre presente e mostra-lhe que é nela que ele deve depositar toda a sua confiança.

A mãe, não abre mão do sorriso indispensável para transformar a dor do filho em alegria, até mesmo quando lágrimas de sangue escorrem do seu coração. A mãe é bela, envolve, aconchega, mima e acaricia.

A mãe é sinónimo de força, de coragem, de determinação, é o pilar que sustenta a família e é a mais
poderosa de todas as mulheres.

A mãe é eterna, no coração daquele que gerou. Que no calor do seio de cada mãe e na chama materna do seu sorriso, cada filho seja capaz de sentir o fogo desse amor e o seu rosto se ilumine e irradie a graça de Deus!
S.S. 

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Avé Maria


Todo o dia eu espero
que esta hora chegue enfim
para sentir que o teu olhar
descansa agora em mim.

Avé Maria
Gratia plena
Dominus tecum
Benedicta Tu.

Venho confiar-te
O que tenho e o que sou
nas tuas mãos chega a Jesus
tudo quanto dou.

Levo a confiança
que o teu amor deixou,
olha por mim, Mãe de Jesus
contigo agora estou.

domingo, 28 de abril de 2013

Dou-vos um mandamento novo



Este domingo, dentro da dinâmica do tempo pascal, é conhecido como o domingo do mandamento novo.

A proposta e a mensagem cristã resume-se neste mandamento novo do amor. 

É o amor que nos distingue, que nos identifica. A forma como amamos os outros ou como não os atendemos e nos doamos a eles mostram a fé que temos ou não temos; quem não aceita o amor, não pode ter qualquer pretensão de integrar a comunidade de Jesus.

Deveremos neste domingo interrogar-nos sobre o que é que está no centro da nossa experiência cristã! A nossa religião é a religião do amor! A fé que seguimos resume-se e manifesta-se no amor. Não se pode confundir nunca com uma religião apenas de leis, de exigências, de ritos externos. A fé que temos em Cristo vivo e ressuscitado manifesta-se e vive-se na doação e não na aparência do espetáculo ou do rito sempre igual que ganhou raízes de lei.

Com que força nos impomos no mundo – a força do amor, ou a força da autoridade prepotente e dos privilégios?

A Igreja, da qual todos fazemos parte fundamental, demasiadas vezes, sob a capa da autoridade e peso social serviu-se e não serviu... apresentou um rosto belo mas vazio de sentido porque vazio de amor!

Falar de amor hoje pode ser equívoco… A palavra “amor” é, tantas vezes, usada para definir comportamentos egoístas, interesseiros, que usam o outro, que fazem mal, que limitam horizontes, que roubam a liberdade… 

O amor que Jesus hoje no evangelho apresenta é diferente... é o amor que acolhe, que se faz serviço, que respeita a dignidade e a liberdade do outro, que não discrimina nem marginaliza, que se faz dom total (até à morte) para que o outro tenha mais vida. 

É este o amor que vivemos e que partilhamos?

Por um lado, a comunidade de Jesus tem de testemunhar, com gestos concretos, o amor de Deus; por outro, ela tem de demonstrar que a utopia é possível e que os homens podem ser irmãos. É esse o nosso testemunho de comunidade cristã?

Nos nossos comportamentos e atitudes uns para com os outros, os homens descobrem a presença do amor de Deus no mundo?


(Fonte: Guarda Teologia)

sábado, 27 de abril de 2013

Espinhos...

Um homem plantou uma rosa e passou a regá-la constantemente.

Antes que ela desabrochasse, ele examinou-a bem e viu o botão que em breve desabrocharia, mas notou espinhos sobre o talo e pensou:

"Como pode uma flor tão bela vir de uma planta rodeada de espinhos tão afiados?"

Entristecido por este pensamento, a partir desse momento, recusou-se a regar a rosa e antes mesmo de estar pronta para desabrochar, ela morreu.

Assim acontece com muitas pessoas.

Dentro de cada alma há uma rosa:

 São as qualidades dadas por Deus.

Dentro de cada alma temos também os espinhos:

São as nossas faltas e fragilidades.

Quando olhamos para nós mesmos demasiadas vezes vemos apenas os espinhos, os defeitos e se calhar desesperamos até e pensamos que nada de bom pode vir do nosso interior.

Pode até acontecer que nos recusemos a regar o bem dentro de nós e, consequentemente, a nossa rosa interior vai morrer antes de florescer.

Nunca percebemos o nosso potencial.

Algumas pessoas nao vêem a rosa dentro delas mesmas. Recusam-se a deixar crescer o bem plantamos por Deus. Vivem a fugir de si próprios e da vontade que Deus tem para cada um de nós.

A missão da Igreja e da fé deveria ser esta… mostrar que apesar dos nossos defeitos e limitações haveremos de florescer porque Deus plantou uma bela rosa dentro de nós

Deveremos cuidar bem do nosso interior e cumprir o mandamento novo do amor… para que as nossas rosas interiores e as dos outros possam florescer plenamente na alegria e no amor que partilhamos de forma permanente uns com os outros.

domingo, 7 de abril de 2013

Misericordias Domini


O Senhor alegra-se pela tua disponibilidade para estar com Ele. Alegra-se por poder habitar no teu coração, deixa esta alegria preencher o teu domingo, para experimentares em ti a Alegria da Ressurreição!
"Felizes os que acreditam sem terem visto!"

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Ressuscitou, Aleluia

Há uma alegria indizível nestes dias pascais. De cada aparição do Senhor Ressuscitado escoa-se uma luz suave, uma gentileza nas palavras, uma tranquilidade nos gestos impossíveis de encontrar em qualquer outra altura do ano!
Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom, porque é eterna a Sua misericórdia. O Senhor é a minha força e a minha glória!
Senhor eu creio mas aumenta a minha fé!


«Porque procurais entre os mortos Aquele que vive? Não está aqui; ressuscitou!» 
Lc 24


domingo, 24 de março de 2013

Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonaste



Com o Domingo de Ramos chegamos à Semana Santa, durante a qual somos todos interpelados a meditar na Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus que, ao entregar, voluntariamente, a Sua vida, revela-nos o grande Amor divino e liberta-nos das amarras do egoísmo e do cativeiro do pecado. Este dia representa a entrada de toda a vida cristã e ajuda-nos a viver o mistério da Paixão e Morte de Cristo!

Na liturgia da Palavra de hoje estes três textos marcaram-me de forma mais profunda:

«Mestre, repreende os teus discípulos». Mas Jesus respondeu: «Eu vos digo: se eles se calarem, gritarão as pedras.»

O Senhor deu-me a graça de falar como um discípulo, para que eu saiba dizer uma palavra de alento aos que andam abatidos. O Senhor Deus abriu-me os ouvidos e eu não resisti nem recuei um passo.

Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz.”

Jesus desafia-nos a reforçar a nossa fé e a renovarmos o nosso coração. Aconselha-nos a ser verdadeiros discípulos e a percorrer os Seus caminhos, ainda que estes sejam tortuosos e cheios de obstáculos! Nada nos pode deter, nada nos pode desviar!

Como verdadeiros discípulos devemos acompanhar Jesus e carregar, com Ele, a Sua Cruz! Como verdadeiros discípulos devemos trocar a crítica pelo elogio, a inveja pelo desapego, a mentira pela verdade, a injúria pela rectidão, a maldade pela generosidade, a maledicência pela caridade! Como verdadeiros discípulos é necessário escutar o que Deus nos diz sem resistências e sem recuos. Primeiro é necessário escutar para que depois se possa levar ao mundo a Boa Nova...é assim que a nossa fé é alimentada!

O discípulo sabe” dizer uma palavra de alento aos que andam abatidos”.  
  
S. Lucas na descrição da Paixão de Cristo dá ênfase a quatro momentos: a Última Ceia, a Agonia, o Julgamento e a Condenação e a Crucifixão!

Jesus fala da Sua morte, da traição, isola-se para pedir ao Pai que o livre da agonia e, em todos estes momentos, sente-se infinitamente só! Este sentimento é claro na descrição do evangelista, durante a Ceia, quando nos diz que, enquanto Jesus fala da Sua morte, os discípulos discutem sobre quem entre eles é o maior e quando se encontra no Horto, os amigos entram num sono profundo! A partir deste momento é preso, acusado, condenado e, finalmente, crucificado! 

Sem dúvida que só quem ama verdadeiramente é capaz de tal prova! Será que conseguimos avaliar, correcta e conscientemente, o sofrimento de Jesus?

Somos discípulos, sabemos que Cristo morre na cruz para nos salvar e é este o Amor total e absoluto de Deus para com cada um de nós. É na cruz que Jesus assume todo o sofrimento e fá-lo por cada um de nós! É na cruz que Ele assume a dor da crítica, da injustiça, da mentira, da rejeição! É na cruz que Jesus se torna solidário com cada um de nós! É na cruz que, em silêncio, nos mostra o derradeiro momento de uma vida feita de dom e de graça para nos salvar. Cristo veio para nos redimir do nosso pecado que torna o Seu sofrimento ainda mais profundo. 

E nós, discípulos, como vamos viver esta semana? Vamos querer saber quem entre nós é o maior ou ainda dormir indiferentes à agonia que Jesus, em breve, irá viver?

Façamos silêncio e invoquemos o Espírito Santo pedindo-Lhe que nos ajude a entrar em contacto com Deus para que possamos despertar para o verdadeiro motivo da cruz, para tudo o que nos aproxima do caminho da Salvação.
S.S



sábado, 23 de março de 2013

Desiderata


Caminha placidamente entre o ruído e a pressa. Lembra-te de que a paz pode residir no silêncio.
Sem renunciares a ti mesmo, esforça-te por seres amigo de todos.
Diz a tua verdade quietamente, claramente.
Escuta os outros, ainda que sejam torpes e ignorantes; cada um deles tem também uma vida que contar.
Evita os ruidosos e os agressivos, porque eles denigrem o espírito.
Se te comparares com os outros, podes converter-te num homem vão e amargurado: sempre haverá perto de ti alguém melhor ou pior do que tu.
Alegra-te tanto com as tuas realizações como com os teus projectos.
Ama o teu trabalho, mesmo que ele seja humilde; pois é o tesouro da tua vida.
Sê prudente nos teus negócios, porque no mundo abundam pessoas sem escrúpulos.
Mas que esta convicção não te impeça de reconhecer a virtude; há muitas pessoas que lutam por ideais formosos e, em toda a parte, a vida está cheia de heroísmo.
Sê tu mesmo. Sobretudo, não pretendas dissimular as tuas inclinações. Não sejas cínico no amor, porque quando aparecem a aridez e o desencanto no rosto, isso converte-se em algo tão perene como a erva.
Aceita com serenidade o cortejo dos anos, e renuncia sem reservas aos dons da juventude.
Fortalece o teu espírito, para que não te destruam desgraças inesperadas.
Mas não inventes falsos infortúnios.
Muitas vezes o medo é resultado da fadiga e da solidão.
Sem esqueceres uma justa disciplina, sê benigno para ti mesmo. Não és mais do que uma criatura no universo, mas não és menos que as árvores ou as estrelas: tens direito a estar aqui.
Vive em paz com Deus, seja como for que O imagines; entre os teus trabalhos e aspirações, mantém-te em paz com a tua alma, apesar da ruidosa confusão da vida.
Apesar das suas falsidades, das suas lutas penosas e dos sonhos arruinados, a Terra continua a ser bela.
Sê cuidadoso.
Luta por seres feliz.


(Inscrição datada do ano de 1692. Foi encontrada numa sepultura, na velha igreja de S. Paulo de Baltimore – hoje já não se pensa que seja esta a origem, mas assim é mais bonito…o verdadeiro autor: Max Ehrmann )

sexta-feira, 22 de março de 2013

O menino de sua mãe


Estava aqui pensando nos velhos tempo de escola...será que velhos é palavra correcta? 

Bem, talvez velhos não serão já que tempos de escola são sempre tempos presentes, pelo menos no livro da nossa memória e o presente não é velho! Ou será?! 

Mas hoje esses tempos parecem tão distantes...não havia telemóveis, mas conseguíamos comunicar uns com os outros na perfeição...podia não ser naquele preciso instante, mas era na altura certa e tudo se fazia e conseguia com tranquilidade.

Estava aqui a pensar nos velhos tempos de escola...

Que diferentes que nós éramos, como eram também diferentes os nossos sonhos, as nossas ambições, as nossas perspectivas em relação ao futuro...que diferentes éramos!

Estava aqui a pensar...e veio-me à memória aquela aula de Língua Portuguesa...o professor chamava-se Guilherme e era um apaixonado por basquetebol...era não apenas o Professor, mas o amigo! De repente, recordo-me de um poema, que declamei e me proporcionou uma nota excelente e, ainda hoje, consigo saber de cor...

Que maravilha ter um professor que ensina, nos velhos tempos de escola e se mantém presente até hoje!




"No plaino abandonado 
Que a morna brisa aquece, 
De balas trespassado — 
Duas, de lado a lado —, 
Jaz morto, e arrefece.

Raia-lhe a farda o sangue. 
De braços estendidos, 
Alvo, louro, exangue, 
Fita com olhar langue 
E cego os céus perdidos.

Tão jovem! que jovem era! 
(Agora que idade tem?) 
Filho único, a mãe lhe dera 
Um nome e o mantivera: 
"O menino da sua mãe".

Caiu-lhe da algibeira 
A cigarreira breve. 
Dera-lhe a mãe. Está inteira 
E boa a cigarreira. 
Ele é que já não serve.

De outra algibeira, alada 
Ponta a roçar o solo, 
A brancura embainhada 
De um lenço... Deu-lho a criada 
Velha que o trouxe ao colo.

Lá longe, em casa, há a prece: 
"Que volte cedo, e bem!" 
(Malhas que o Império tece!) 
Jaz morto, e apodrece, 
O menino da sua mãe."

(Fernando Pessoa)

quinta-feira, 21 de março de 2013

Recomeça...

Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças.


Miguel Torga

terça-feira, 19 de março de 2013

Não devemos ter medo da bondade, da ternura

Entretanto a vocação de guardião não diz respeito apenas a nós, cristãos, mas tem uma dimensão antecedente, que é simplesmente humana e diz respeito a todos: é a de guardar a criação inteira, a beleza da criação, como se diz no livro de Génesis e nos mostrou São Francisco de Assis: é ter respeito por toda a criatura de Deus e pelo ambiente onde vivemos. É guardar as pessoas, cuidar carinhosamente de todas elas e cada uma, especialmente das crianças, dos idosos, daqueles que são mais frágeis e que muitas vezes estão na periferia do nosso coração. É cuidar uns dos outros na família: os esposos guardam-se reciprocamente, depois, como pais, cuidam dos filhos, e, com o passar do tempo, os próprios filhos tornam-se guardiões dos pais. É viver com sinceridade as amizades, que são um mútuo guardar-se na intimidade, no respeito e no bem. Fundamentalmente tudo está confiado à guarda do homem, e é uma responsabilidade que nos diz respeito a todos. Sede guardiões dos dons de Deus!

Queria pedir, por favor, a quantos ocupam cargos de responsabilidade em âmbito económico, político ou social, a todos os homens e mulheres de boa vontade: sejamos «guardiões» da criação, do desígnio de Deus inscrito na natureza, guardiões do outro, do ambiente; não deixemos que sinais de destruição e morte acompanhem o caminho deste nosso mundo! Mas, para «guardar», devemos também cuidar de nós mesmos. Lembremo-nos de que o ódio, a inveja, o orgulho sujam a vida; então guardar quer dizer vigiar sobre os nossos sentimentos, o nosso coração, porque é dele que saem as boas intenções e as más: aquelas que edificam e as que destroem. Não devemos ter medo de bondade, ou mesmo de ternura.

A propósito, deixai-me acrescentar mais uma observação: cuidar, guardar requer bondade, requer ser praticado com ternura. Nos Evangelhos, São José aparece como um homem forte, corajoso, trabalhador, mas, no seu íntimo, sobressai uma grande ternura, que não é a virtude dos fracos, antes pelo contrário denota fortaleza de ânimo e capacidade de solicitude, de compaixão, de verdadeira abertura ao outro, de amor. 
Não devemos ter medo da bondade, da ternura!


Hoje, juntamente com a festa de São José, celebramos o início do ministério do novo Bispo de Roma, Sucessor de Pedro, que inclui também um poder. É certo que Jesus Cristo deu um poder a Pedro, mas de que poder se trata? À tríplice pergunta de Jesus a Pedro sobre o amor, segue-se o tríplice convite: apascenta os meus cordeiros, apascenta as minhas ovelhas. Não esqueçamos jamais que o verdadeiro poder é o serviço, e que o próprio Papa, para exercer o poder, deve entrar sempre mais naquele serviço que tem o seu vértice luminoso na Cruz; deve olhar para o serviço humilde, concreto, rico de fé, de São José e, como ele, abrir os braços para guardar todo o Povo de Deus e acolher, com afecto e ternura, a humanidade inteira, especialmente os mais pobres, os mais fracos, os mais pequeninos, aqueles que Mateus descreve no Juízo final sobre a caridade: quem tem fome, sede, é estrangeiro, está nu, doente, na prisão (cf. Mt 25, 31-46). Apenas aqueles que servem com amor capaz de proteger.

Na segunda Leitura, São Paulo fala de Abraão, que acreditou «com uma esperança, para além do que se podia esperar» (Rm 4, 18). Com uma esperança, para além do que se podia esperar! Também hoje, perante tantos pedaços de céu cinzento, há necessidade de ver a luz da esperança e de darmos nós mesmos esperança. Guardar a criação, cada homem e cada mulher, com um olhar de ternura e amor, é abrir o horizonte da esperança, é abrir um rasgo de luz no meio de tantas nuvens, é levar o calor da esperança! E, para o crente, para nós cristãos, como Abraão, como São José, a esperança que levamos tem o horizonte de Deus que nos foi aberto em Cristo, está fundada sobre a rocha que é Deus.

Guardar Jesus com Maria, guardar a criação inteira, guardar toda a pessoa, especialmente a mais pobre, guardarmo-nos a nós mesmos: eis um serviço que o Bispo de Roma está chamado a cumprir, mas para o qual todos nós estamos chamados, fazendo resplandecer a estrela da esperança: Guardemos com amor aquilo que Deus nos deu!


Peço a intercessão da Virgem Maria, de São José, de São Pedro e São Paulo, de São Francisco, para que o Espírito Santo acompanhe o meu ministério, e, a todos vós, digo: rezai por mim!

Ámen.

(Excertos da homilia do Papa Francisco)